memória





Octávio e Pina Tegão, 
sonhos e anseios, ações e história

O convite
Comecei a pesquisar sobre Octávio e Pina Tegão quando fui solicitado para realizar uma pequena cena sobre o teatro na cidade. Entre tantas referências que conhecia sobre teatro no ABC, eu queria a origem de tudo, do teatro na cidade e, sendo assim, cheguei ao São Caetano Esporte Clube: o primeiro lugar da cidade que ofereceu espetáculos e festivais dramáticos dançantes na década de 1920 e 1930. A presença de Octávio e Pina Tegão era marcante e reluzia nas páginas e fotos amareladas pelo tempo.

A história conhecida
Numa EMEI, a alguns quarteirões da minha casa, o nome “Octávio Tegão” está eternizado na fachada. Mas esse nome está lá pela presença desse homem no poder legislativo dos primeiros anos da nova cidade de São Caetano.
Eu tinha informações básicas. Ele trabalhava no cartório da cidade e ela, após o casamento, já não trabalhava mais. O que tinham em comum? Eram casados. E o que mais? Eram atores. E vou mais além, os pioneiros do teatro na cidade. Junto com alguns amigos - Mateus Constantino, Aldo Negrini, Teodomiro Sigolo, Constantino de Moura Baptista, Dante Negrini - foram a primeira porta de entrada do teatro em São Caetano.

A saga
E então era isso... E agora? Para onde ir? O que fazer?
O arquivo de documentos e materiais existentes no acervo da cidade sobre Octávio se resumia ao seu período do legislativo e, sobre Pina, nada, nem uma foto, um documento sequer. Apenas algumas citações.
Surtei! Como eu ia escrever uma cena sobre duas pessoas teatro se, até então, eles eram grande referência por conta de suas ações no poder legislativo da cidade? 
Resolvi apelar, precisava descobrir algo, porém não tinha nenhum dado sobre a família. Tiveram filhos? Moravam onde? E os filhos moravam na cidade ainda? Aonde ir? Onde poderia encontrá-los? Qual é o lugar onde nosso fim é inevitável? Uma resposta: Cemitério.
Conhecendo um pouco sobre a história da cidade, já sabia para qual dos três cemitérios existentes eu tinha que seguir. Cheguei à secretaria e, com a data de falecimento dele, olhei o livro de registro de óbitos do mês de julho de 1966. Nada! Não tinha registro. Minha última esperança caiu por terra. Eu sem saber para onde ir e o diretor do cemitério de mãos atadas. Mas, num momento de iluminação divina, uma das mulheres que limpa os túmulos, naquele instante passava pela secretaria e se sentiu familiarizada pelo nome. E lá vou eu em busca do túmulo junto com a funcionária que já lera aquele sobrenome em alguma lápide.
Surpresa! Ela foi direto ao túmulo. Mão divina, quem sabe?!
Vi a foto de Pina Tegão que, a partir daí, virou Josephina Juliani Tegão e reencontrei Octávio.
Com o endereço do familiar responsável pelo túmulo na mão, toquei a campainha e quem atendeu foi uma senhora, cunhada do casal Tegão. Uma conversa de dez minutos no portão me elucidou várias coisas. Mas eu queria mais. Ela então passou o telefone de Sérgio Tegão, um dos filhos do casal, que mora em São Caetano.

Uma ligação e uma visita
Liguei. Coração na boca, mão tremendo e lábia afiada. Tudo perda de tempo, afinal, quem não gosta de falar sobre o passado?
Marcamos um bate papo numa tarde nublada de quinta-feira. E a conversa regada a café e bolo me convidou para entrar no livro de memórias da família Tegão.

George Vilches e Andréa 
Damasceno (Cia.TEMT, 2009)
A cena e o dia
Eu já tinha minha cena e tudo estava pronto, figurinos, adereços e produção geral.  Atores ensaiados e afiados fariam o casal Tegão. No dia da apresentação tivemos mais um momento divino (ou não!), o ator que faria Octávio acordou sem voz. Socorro! Quem faria o papel?
E lá vou eu! De terno e gravata, com um presente surpresa, dou vida a Octávio Tegão. No fim da cena, que felicidade, os representantes da família dos pioneiros acima citados comentaram como o casal de ficção se aproximou do casal real. Mão divina de novo?

A história
Octávio Tegão nasceu em Rio das Pedras, região de Piracicaba, interior de São Paulo, no dia 20 de setembro de 1898. Já Josephina Juliani Tegão, conhecida como Pina, nasceu em São João da Boa Vista, interior de São Paulo, no dia 02 de novembro de 1907.
Tiveram dois filhos: Mário Luiz e Sérgio.
Foram atores de teatro amador e fundadores do Grêmio Instrutivo e Recreativo Ideal. Atuaram em peças como “Escravo e Cocaína”, “Deus e a Natureza”, “ O Filho do Adultério”, “Os Dois Sargentos” entre outros.
Octávio Tegão recebeu o título de cidadão sul-sancaetanense e Pina Tegão ficou eternizada como a primeira atriz da cidade. Desenvolveram várias ações em prol da cultura e tiveram participação marcante na história cultural da cidade.
O conservadorismo e os tabus, então vigentes na sociedade, não foram impedimento para esses dois artistas que abriram caminho para outros que viriam nos anos seguintes.
Octávio faleceu em 05 de julho de 1966 e Pina em 09 de março de 1977.

O fim, o artigo e a EMEI
Fico muito feliz quando penso nessa pequena aventura que terminou com uma matéria escrita para a revista Raízes de São Caetano, cujo objetivo é manter a história viva.  O foco dessa matéria não foi o casal influente nas decisões políticas da nova cidade, mas sim o casal de atores que iniciou o teatro em São Caetano.
Hoje, quando passo pela EMEI Octávio Tegão, sorrio. Ela já não é a mesma, mas continua lá. Eu não sou mais o mesmo e continuo seguindo. Octávio e Pina vão continuar também, enquanto existir teatro no ABC, enquanto existir memória. Para sempre.


George Vilches é ator, artista orientador e diretor teatral formado pela Fundação das Artes de São Caetano do Sul. Coordena a Cia.TEMT (Cia. de Teatro Experimental Maria Tita) que completa 10 anos em 2011. Desenvolve trabalhos de pesquisa sobre a memória de São Caetano do Sul e está no último semestre da faculdade de pedagogia na Universidade Metodista.

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