domingo, 13 de fevereiro de 2011

E o palhaço, o que é?


Dr. Nérdolino Wasowsky e Dra. Pafúncia Maionese 

Não sei, mas ele é. Assim como eu e você, de verdade. Mora naquilo que a gente tem de melhor, mas que insistimos em chamar de pior e “o” queremos esconder. Ele é feliz do jeito que é. A gente também, mas não falamos muito sobre isso. É mais divertido falar o contrário, contar nossas angústias, sofrimentos e aflições. Quando falamos das desgraças, a gente abafa o caso, desabafa e lava a alma. A sensação de colocar coisas ruins pra fora é muito boa. O que já não acontece com as coisas boas. Não é tão legal falar sobre elas.

Cara pintada, roupa diferente, máscara pequena. Tudo isso pra mostrar que é autêntico, que não usa máscara nenhuma, que é real e o quão “mascarados” nós somos. Eita palhaçada!

O riso é racional, está totalmente ligado à lógica. É impossível rir daquilo que não se entende. Existe um padrão para cada coisa nesta vida. Um padrão para a beleza, um padrão social, um padrão de vida, de profissão, de status, etc. Quando algum padrão é quebrado, abrem-se as portas para o terreno do inadequado. E é neste terreno que mora o filho torto de Deus – o palhaço.

Quando ele tropeça, a gente ri. Quando ele chora, a gente ri. Quando ele sofre, a gente ri. Quem é que não gosta de uma pitadinha de maldade? O ser humano é sádico, por natureza. Nada adianta aos puritanos de plantão, segurar o “riso maldoso” e se benzer depois disso ou pedir perdão pelo ato, pois mais um “x” foi acrescentado ao seu nome, no Grande Livro. Não dá pra fugir do instinto, daquilo que é puro. O palhaço não foge. Mas ele também não quer ter o nome marcado no Grande Livro. Então ele, inocentemente, faz exatamente a mesma coisa que a gente faz. Aprendeu assim. E a gente ri disso. Ri porque é ridículo. Assim como uma criança que tem cinco anos não consegue enganar ninguém e é engraçado vê-la tentando. A gente ri do palhaço e ri da criança porque no fundo a gente ri da nossa própria imagem, porque a gente também tenta enganar. A diferença é que somos espertos o suficiente para não sermos pegos. Ou pelo menos é nisso que queremos acreditar.

E, juntando o inadequado com a inocência, o palhaço também pode falar de tudo. Sabemos das verdades ridículas do nosso mundo, da sociedade em que vivemos, mas isso a gente fala baixinho porque pode pegar mal falar alto uma coisa destas. Nunca se sabe quem está ouvindo. Mas se é o palhaço que fala, a gente ri, porque para ele não pega mal e todo mundo sabe que aquilo que ele está falando é verdade. Mas ele, coitado, “só pode ser palhaço nessa vida, então não importa muito o que ele diz.”

Como grande parte das coisas do mundo, senão todas, a figura do palhaço também foi banalizada. Hoje o vemos nos faróis, nas portas de lojas fazendo propagandas, nos ônibus e trens pedindo esmolas, na televisão tratando o seu público como babaca.

Palhaço é ofício. E como todo ofício, tem uma função. Precisa de treino, esforço, estudo e dedicação. Tem que ralar, suar a camisa!

E como é gostoso ver um bom palhaço. Aquele que não faz tipo, que não força outra voz, que não finge um personagem. Aquele que depois de tanto tempo de vida e trabalho, mantém viva a chama da inocência e da sinceridade. E a platéia gosta deste palhaço. E não gosta pelo que ele sabe fazer, mas pelo que de fato ele é. Alguém que escolheu como profissão, a menor máscara do mundo. 


Kleber Brianez
Palhaço, ator, artista educador e dublador. Pesquisa e pratica a linguagem do palhaço, desde 1998, com grandes conhecedores desta arte, como Bete Dorgam, Silvia Leblon e os Doutores da Alegria. É sócio fundador e coordenador geral do Grupo Operação de Riso, que leva o trabalho do palhaço para dentro do ambiente hospitalar. Hoje é integrante da Associação Pró Projeto Cultural Brasileiro, onde pesquisa e pratica a linguagem do improviso, utilizando-se do método do Teatro Esporte, sob coordenação geral de Vera Achatkin. 

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